Por Edição Robson Viturino com Álvaro Oppermann
Por Edição Robson Viturino com Álvaro Oppermann
Ilustração Manuela Eichner
O jornalista William Powers, do Washington Post, conta que estava na calçada junto a um semáforo na Times Square, Nova York, esperando para atravessar a rua. De repente, deu-se conta de que todos os oito transeuntes ao seu lado executavam uma mesma tarefa: checavam atentamente seus respectivos smartphones. Alguns digitavam freneticamente, aproveitando com sofreguidão cada segundo. “Estamos sempre online. Em qualquer lugar. Isso pode ser uma benção, mas também uma maldição”, diz Powers. Há horas em que seria melhor dar férias ao laptop, desligar o celular, ou deixar o iPad de lado. Mas como fazer isso sem cair no ostracismo digital?
Conectar-se ou desconectar-se – eis a questão. É interessante que tal questão seja formulada por Powers, um dos papas da tecnologia na mídia norte-americana. Em Hamlet’s BlackBerry (“O BlackBerry de Hamlet”, inédito em português), ele buscou auxílio em autores do panteão literário e filosófico universal para dar cabo à ingrata tarefa. “De um lado, nós temos a necessidade de nos conectar com o mundo exterior. De outro, também necessitamos de tempo e espaço para nós mesmos. A chave é buscar equilíbrio entre as duas coisas”, afirma Powers.
Algumas joias do seu guia para lidar com a tecnologia:
Sócrates e a tecla off_O filósofo Sócrates recomendava aos alunos que tirassem um dia livre para passear nos arredores de Atenas, longe da multidão e do burburinho, deixando de lado suas ocupações e afazeres mundanos. O conselho continua válido, mas tem de ser adaptado, segundo Powers. Em vez de um dia inteiro – luxo impensável à maioria hoje em dia –, meia hora é o suficiente. Powers aconselha deixar o celular desligado por 30 minutos e relaxar. E ele parece seguir o que diz. Em 2006, trocou a capital, Washington, pela bucólica Cape Cod, cidadezinha costeira no estado de Massachusetts, e se livrou do vício dos gadgets (ele não conseguia passar dois minutos sem checar e-mails e mensagens no smartphone).
Sêneca e o Facebook_O filósofo latino Lucius Sêneca viveu em Roma, no século I d.C., o mesmo que os usuários do Facebook e LinkedIn: o excesso de conexões e relacionamentos. O drama de Sêneca chegou a lhe custar problemas de saúde por causa dos excessos de sua vida social. Depois de um colapso nervoso (ou burn-out, para usar um termo atual), ele desenvolveu a teoria do “espaço interior”: concentre-se no que realmente tem importância em seu momento de vida. Se você tentar se conectar com todos à sua volta, perderá a conexão íntima consigo mesmo. A família de Powers viveu este drama. Ele, a esposa e os filhos passavam mais tempo no Facebook do que convivendo entre si. De comum acordo, limitaram o uso da rede social em casa.
Benjamin Franklin e o e-mail_Ele desenvolveu o que chamava de “rituais positivos” para se livrar de maus hábitos. Um deles era acordar antes da aurora (aliás, é o autor da famosa frase “Deus ajuda quem cedo madruga”). Powers, quando se mudou com a família para Cape Cod, instituiu o “fim de semana desplugado”. De sábado pela manhã até o domingo à noite, ele, a esposa e os filhos desligavam smartphones e laptops. “É uma sensação revigorante passar dois dias sem tecnologia, e os efeitos disso perduram bastante tempo, durante a semana”, diz ele. Segundo o autor, muitas empresas que adotaram políticas parecidas, como a da “sexta-feira sem e-mails”, tornaram-se mais produtivas no resto da semana.
Shakespeare e o iPad_Powers nota que Hamlet, o príncipe da Dinamarca, usa o equivalente ao iPad do seu tempo (uma tábua feita de lousa) para escrever seus pensamentos e anotar os acontecimentos à sua volta, como a visita do fantasma do seu pai. Era a “tábua da memória”, na linguagem poética shakespeareana. “O ato de anotar tirava o pensamento de sua dimensão etérea, colocando-o na esfera material da prancheta”, diz Powers. A tábua da memória definia Hamlet, como o iPad nos define hoje em dia. O gadget não é ruim em si, mas por causa do uso que fazemos dele. “Se Hamlet tivesse um BlackBerry, provavelmente o usaria com parcimônia”, afirma o jornalista.
William Powers – É formado em Harvard e, nos últimos anos, tem publicado artigos e livros sobre como as pessoas podem se utilizar das tecnologias sem virar refém delas. Já colaborou com The Atlantic, The New York Times, The Los Angeles Times e The Guardian
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